03 novembro, 2009

Tirando o atraso.

DE ENCONTRO COM O COMPROMISSO DE ESCREVER.
Depois de muito tempo sem atualizar este blog (ainda bem que ele tem poucos leitores) voltar a fazê-lo me leva irremediavelmente a lembrar do filme De Encontro Com O Amor. Embora o título brasileiro mude o foco do filme, ele na realidade é sobre um escritor que desistiu de escrever após a morte de sua mulher.
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Harvey Keitel, mais uma vez brilhante, faz o escritor. Este ao se ver viúvo, abandona New York e se refugia numa apaixonante aldeia na região de Siena, na Itália. Vivendo de direitos autorais, uma colheita anual de uvas e da produção de leite de algumas poucas vacas, ele se dedica a beber, jogar com os amigos mais íntimos (um padre impagável aí incluso), beber novamente, fumar charutos, recordar continuamente a esposa morta e botar para correr jornalistas e editores que não desistem de procurá-lo. Uma de suas filhas, Isabella, cuida deste problema ambulante com suavidade e vigor ao mesmo tempo. Claire Forlani, a mais bela mulher que tenho visto nas telas há algum tempo, interpreta este papel.
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É evidente que o mocinho da história -mais um editor que vai até o refugio do escritor- além de conseguir fazer com que ele volte a escrever, se apaixona por ela. Não me apaixonei por ninguém e ninguém me convenceu a voltar a escrever aqui neste espaço, mas minha mente fez esta associação com o filme. De Encontro... não chega a ser um filme genial. Mas a paisagem de Siena, a atuação de Keitel, a beleza de Claire e o texto, valem os 110 minutos frente à tela, sem hesitação. Especialmente à noite, que na definição de Weldon Parish, nome do personagem escritor, “a tudo encobre e domina com o seu silêncio”. Assista.
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WOODY ALLEN TENTA SE ATUALIZAR. JÁ CHEGOU À DÉCADA DE 80 DO SÉCULO PASSADO.
Gosto de Woody Allen. Acho Manhattan uma obra prima do cinema. Gosto da forma como ele arranca magistrais interpretações de atores sobre os quais nunca tínhamos ouvido falar. Gosto da forma como ele de certa forma minimiza as grandes neuroses urbanas, transformando-as em objetos de consumo dos seus personagens. Gosto da criteriosa escolha dos títulos de seus filmes. A gente se encanta com Todos Dizem Eu Te Amo antes mesmo de ver o filme.
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Woody é inteligente e percebeu que a geração que consegue mergulhar fundo na sua ironia, nas suas citações e nas suas entrelinhas, está morrendo sem reposição. Resolveu então “modernizar” um pouco seus filmes. Vicky, Cristina, Barcelona é para mim o exemplo mais emblemático desta tentativa. Um filme moderninho. Neuroses mais compreensíveis por parte dos neuróticos contemporâneos. Trilha sonora passando muito longe de Gershwin ou Cole. E principalmente atores habituados a gerar bilheteria, como Penélope Cruz ou Javier Bardem.
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É um bom filme, mas o fato dele existir lembra muito -na real- Benjamin Button. Aos 73 anos Woody resolve parecer que tem 40. Com esse olhar ele nos mostra a visão de duas norte americanas passando férias em Barcelona e seu envolvimento com um artista local. Não tem falhas, como não poderia ter e nunca teve em nenhuma dos seus filmes. Mas não tem a griffe Woody Allen. Não seria atribuído a ele se fosse exibido a pessoas que não sabem disso.
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Nesse ritmo ele acabará produzindo um remake de Chapeuzinho Vermelho, ambientado em Caracas e tendo como atriz principal Verônica Belmont. Nem precisa pensar muito pra saber quem interpretará o Lobo Mau. Será que vale a pena buscar a atualização de um estilo –que não é muito flexível- para não perder público com o passar do tempo? Woody acha que sim. A crítica mundial respeita o que ele já fez e reconhece os méritos de Vicky, Cristina, Barcelona. Mas registra aquela sensação de perplexidade. Como se de repente Tio Patinhas virasse um bem sucedido investidor da Bolsa de New York. Pra não sair do cenário favorito de Allen.
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PREFIRO BEIRUTE. DE ROSBIFE COM BASTANTE MAIONESE.
Mais uma vez bato de frente com o cinema nacional. Não tem jeito. Postei aqui um comentário sobre o quanto me deliciei assistindo Bela Noite Para Voar e logo depois, achei que deveria dar mais oportunidades às produções brasileiras. Podia ter me contido. Mas não, resolvi assistir Budapeste, inspirado ou baseado, sei lá, no livro do mesmo nome escrito por aquele rapaz que era um compositor insuperável chamado Chico Buarque e resolveu transformar-se no escritor meia-boca Chico Buarque. O filme segue a mesma batida do livro. É insuportável. A melhor coisa é –pra quem não conhece- um dito popular já senil, que diz: o húngaro é a única língua que o Demônio respeita. Acaba por aí.
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BASTARDOS INGLÓRIOS
Já perdi a conta dos filmes que assisti sobre Hitler, nazismo, holocausto etc. Os que mais me marcaram foram aqueles que mergulharam na alma e nos sentimentos das pessoas, indo remexer no lado humano dos envolvidos.
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Entre estes, A Lista de Schindler é um destaque, assim como O Menino de Pijama Listrado e A Espiã. Podem me apedrejar, mas não gosto de A Vida É Bela. Acho que ele ultrapassou a tênue linha que separa a tragédia da comédia e caiu para o lado errado. Agora surge Brad Pitt com cara de mau comandando um grupo de judeus americanos a escalpar nazistas onde quer que eles se encontrem.
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O filme de Tarantino é uma viagem grotesca entre a fantasia e a realidade, com tintas exageradas em ambos os quadros. Quem gosta de Tarantino –e ele tem esse poder de sedução- adora tudo o que ele faz. Quem, como eu, mantêm um certo distanciamento crítico, não consegue gostar ou não gostar do filme. A gente sabe que está diante de algo competente, estruturado, pensado, mesmo que a estética de Tarantino seja o caos que costuma ser. Mas não conseguimos captar a intenção principal de tudo aquilo.
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Reverter a história? Ridicularizar os nazistas? Glorificar os marines? Revelar algo desconhecido que aconteceu na 2ª Guerra? Não consegui saber. Brad Pitt é um ator competente. Interpretar a morte como ele fez em Encontro Marcado é suficiente para sabermos que estamos vendo um ator maiúsculo. Em Bastardos ele não encontra espaço para ser competente. A direção de Tarantino o faz oscilar entre o grotesco, o patético, o cômico e o cruel, sem convencer em nenhum dos papéis. Enfim, resta o consolo de saber que depois de ter explodido toda a cúpula do III Reich –Adolf à frente- dentro de um pequeno cinema, Tarantino não mais voltará ao assunto.